Não me digas que sabes de mim
Não me digas que reconheces o lugar onde tantas vezes
Os nossos corpos ungidos pelo beijo e pelo cio
Se largaram quentes e caminharam em sentidos distantes
Muito antes de se unirem na terra solta.
Não me digas que ainda aqueces
Sempre que chove
O leito onde nos deitávamos a escutar os grandes silêncios
molhados e salpicados apenas por uma ou outra gota que
nas telhas fazia o seu abrigo.
Não me digas que te sentas ainda
À longínqua lareira pintada de verde
E estendes as mãos abertas para as chamas como se o
Universo inteiro te esperasse para te agasalhar.
Não me digas que sabes ainda a minha morada.
Não me digas que sabes da minha rua, da minha porta.
Durante tanto tempo deixei que o sol se fosse para te deitar
ao meu lado
Durante tanto tempo deixei que a lua se esquivasse para te
acordar e para seres a minha luz.
Não me digas que sabes de mim
Como podes dizer-me que sabes de mim se não sabes onde
mora a minha alma?
A minha alma.
Cidália Fernandes nasceu em Vieiro, Conselho de Vila-Flor em Portugal.
Professora de Português no ensino secundário.
Autora de dezenas de livros didáticos, romances e poesias.
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